Em mais um exemplo de ataque das operadoras de pagamento ao trabalho sexual, Visa e MasterCard anunciaram que não processarão pagamentos para o Backpage.com, um popular site de publicidade adulta. Evidentemente, as feministas radicais da segunda onda consideram esse desenvolvimento uma maneira “progressista” de tornar a vida do traficante ou cafetão médio mais difícil”. Porém, como Miss Andrie argumenta na revista Tits and Sass (“What the hell is going on with Backpage?”, 3 de julho), a proibição afetará desproporcionalmente as trabalhadoras do sexo mais pobres e marginalizadas — aquelas que não têm a formação educacional e as habilidades técnicas para utilizar sistemas de pagamento como o Bitcoin e consideram o Backpage simples e acessível.
De forma mais geral, o principal ônus dessas medidas não recai sobre o trabalho sexual, mas sobre as trabalhadoras do sexo. Elas não reduzem a quantidade de trabalho sexual que ocorre na sociedade, apenas requerem que as mulheres trabalhem mais em troca de menos dinheiro e sob condições mais perigosas e desfavoráveis. O chamado “modelo escandinavo” é predicado na ideia risível de que é possível reprimir os clientes sem tornar as próprias trabalhadoras do sexo mais vulneráveis à polícia, que pode estuprá-las, ou cada vez mais dependentes dos clientes mais violentos e abusivos.
As trabalhadoras do sexo tentam rotineiramente explicar essa situação para os sujeitos de sempre (isto é, as feministas brancas de classe média-alta que escrevem para o The Guardian). O problema é que estas últimas estão tão absolutamente certas de que são as salvadoras brancas e das qualidades incríveis de seu modelo escandinavo que simplesmente não escutam (algo que já testemunhei diversas vezes quando as auto-proclamadas abolicionistas do movimento anti-“tráfico” impedem que mulheres pobres e negras trabalhem, pensando estarem injetando uma dose de realidade no debate).
A verdade é que essas falsas esquerdistas não se importam se sua ideologia prejudica os seres humanos de carne e osso que pretende beneficiar. Como seu aliado conservador, o senador canadense Donald Plett, afirmou: “É claro que não queremos tornar a vida mais segura para as prostitutas; nós queremos acabar com a prostituição”.
Os antecessores desse movimento, os progressistas e fabianos de um século atrás, admitiam francamente que suas políticas pretendiam estabelecer uma forma de “socialismo” voltada aos trabalhadores industriais com as capacidades requeridas (sob a direção de gerentes profissionais como eles mesmos, é claro). Como parte do programa, o estado “benevolente” também promoveria a gradual extinção do lumpenproletariado e das classes inferiores. Alguns deles, como H.G. Wells e Sidney e Beatrice Webb, queriam estabelecer que o auxílio aos indigentes deveria obedecer condições de “tratamento e supervisão disciplinar” em “estabelecimentos trabalhistas celibatários”. Aqueles que não eram empregáveis mesmo em “trocas forçadas de trabalho” teriam que entrar em cursos de treinamento “onde teriam todo o seu horário mapeado em um programa contínuo e adequadamente variado de trabalho físico e mental, composto inteiramente de atividades com o maior valor educacional”. Wells era explícito ao afirmar que a eliminação de moradias baratas e dos trabalhos de menores salários servia para “convencer as pessoas de que ter filhos em tal atmosfera desfavorável é algo extremamente inconveniente e desfavorável”.
Claro, os fabianos e progressistas eram eugenistas; entre as conquistas destes estava a esterilização forçada dos “isolados tri-raciais” — membros de vários grupos étnicos norte-americanos descendentes de escravos, brancos pobres e nativos americanos que formaram sociedades de autogoverno em áreas dos EUA que os senhores de escravos e credores não podiam chegar.
Os descendentes modernos desses engenheiros sociais pseudo-esquerdistas inclui muito mais do que esses ativistas anti-“tráfico”. Os maiores defensores das leis contra dormir em carros e outras regulamentações que elevam o piso para uma subsistência confortável são os bons samaritanos social-democratas, que afirmam serem motivados por uma preocupação com o bem estar dos pobres. Contudo, o maior efeito dessas leis, além de criminalizar as tentativas dos pobres de melhorarem as próprias vidas (Charles Johnson, “Segurando as pontas: Como o governo cria a pobreza como a conhecemos,” 1º de dezembro de 2007), é melhorar esteticamente a qualidade de vida das classes altas que as promovem.
É estranho que essas pessoas jamais ataquem qualquer coisa além dos sintomas da desigualdade de classe e da exploração econômica, fechando todas as alternativas mitigadoras a não ser aquelas controladas por elas próprias, sem jamais tocar nas causas estruturais dos problemas, fortalecendo os trabalhadores contra os patrões, os locatários contra os locadores e minam a dominação dos rentistas e tecnocratas sobre a sociedade. Quer dizer, talvez não seja tão estranho assim, se a gente parar para pensar bem.