Câmeras nos uniformes de policiais estão na moda. O ativista pelos direitos civis Al Sharpton quer usá-las para monitorar as atividades dos policiais. A comentarista política Ann Coulter deseja usá-las para “calar a boca” de Al Sharpton. A Casa Branca quer implementá-las porque, bem, elas são uma forma de ser “duro com a violência policial” e “duro com o crime”, gastanto US$ 263 milhões em uma nova tecnologia.
Quando Al Sharpton, Ann Coulter e o presidente dos Estados Unidos concordam em algo, minha reação imediata e visceral é de ceticismo extremo. Neste caso, os fatos conhecidos dão suporte a esse ceticismo.
É absolutamente improvável que o uso disseminado de câmeras em uniformes de policiais reduza a incidência ou a severidade da violência policial injustificada. Nós já vimos quais foram os resultados de várias “soluções” tecnológicas para esse problema.
A introdução de sprays de pimenta e tasers como armas para a polícia estimulou uma atitude confrontativa com os “suspeitos” (“suspeito” é policialês para “qualquer um que não seja um policial”). Sua suposta não-letalidade facilitava a substituição das conversas pacíficas por ações violentas.
A introdução de armas e veículos militares para a polícia também não produziu uma diminuição da violência. Pelo contrário: agora nós podemos testemunhar departamentos policiais em todo o país fazerem suas reencenações da ocupação nazista de Paris em muitas cidades.
E quanto às chamadas “dashcams”? Essa é a comparação mais óbvia. As dashcams, porém, parecem sempre estar com defeito ou os departamentos de polícia misteriosamente perdem as gravações quando surge uma denúncia de abuso policial.
Por outro lado, é absolutamente certo que o uso disseminado dessas câmeras aumentaria o escopo e a eficácia da vigilância autoritária estatal.
A proposta da Casa Branca pede a aquisição inicial de 50.000 câmeras. Alguém duvida que as gravações sejam utilizadas e analisadas em comparação com os bancos de dados policiais (que incluem bancos de reconhecimento facial) continuamente?
Se uma câmera fica presa a um policial específico por um período de oito horas diárias (em vez de ser usada por vários policiais continuamente durante o dia), são 400.000 horas por dia de buscas aleatórias sem mandado que podem ser usadas o tempo inteiro em busca de causas prováveis para investigar e prender pessoas. Nem a Polícia do Pensamento em 1984 de George Orwell carregava câmeras portáteis em todos os lugares!
A tecnologia de vídeo certamente é parte da solução para a violência policial, mas essa solução deve permanecer nas mãos de pessoas comuns, não do estado. Mais e mais indivíduos diariamente conseguem acesso a tecnologias de gravação de vídeo, juntamente com serviços de armazenamento na internet que não podem ser destruídos ou alterados pelas autoridades. Os policiais precisam aparecer em câmeras que não controlam.
Parte da solução, porém, é somente parte da solução. Mesmo quando as câmeras pegam policiais violentos, abusivos e criminosos em ação — como, por exemplo, quando câmeras de segurança filmaram os policiais Manuel Ramos e Jay Cicinelli de Fullerton na Califórnia espancando o sem teto Kelly Thomas até a morte em 2011 –, é incrivelmente dificil condená-los ou mesmo abrir processos contra eles.
A ubiquidade do monitoramento em vídeo dos agentes estatais é um começo. Mas a única possibilidade real de garantir o fim da violência estatal é acabar com a polícia estatal — e, na verdade, acabar com o próprio estado.