Quando liguei a TV para assistir o discurso de Barack Obama sobre seus planos para a guerra contra o chamado “Estado Islâmico”, eu esperava exatamente o que foi dito — uma verborragia pseudopatriótica, o anúncio mais subsídios ao complexo militar-industrial com um toque de mudança de regime na Síria. O que eu não esperava era a homenagem que seria prestada a uma era anterior:
“[Nós] não enviaremos garotos americanos a 14 ou 15 mil quilômetros de casa para fazer o que os próprios asiáticos deveriam estar fazendo por conta própria.” — Presidente dos EUA Lyndon Johnson, 21 de outubro de 1964.
“[Nós] não podemos fazer pelos iraquianos o que eles devem fazer por conta própria (…).” — Presidente do EUA Barack Obama, 10 de setembro de 2014.
É uma inversão curiosa: a observação de Lyndon Johnson ocorreu no final da era do “aconselhamento” no Vietnã e antes da enorme intervenção militar direta naquele país. A reprise de Obama acontece depois de quase 25 anos de gigantescas intervenções americanas diretas no Iraque e pretende fazer o caminho contrário, levando os Estados Unidos de volta a um papel de “aconselhamento”. Curioso, mas claramente não acidental.
Todos nos lembramos de como acabou o Vietnã. Após a derrota em duas guerras em terra na Ásia nos últimos 12 anos e ao consultar os livros de história da era pós-Segunda Guerra Mundial, poderíamos esperar que Obama tivesse aprendido sua lição. E estaríamos certos.
Infelizmente, a lição que ele aprendeu não é a mais óbvia (fiquem na sua, EUA!). Pelo contrário, a lição foi de que as guerras americanas não precisam ser “vencidas”. A medida de sucesso desde 1945 não era a vitória militar sobre um inimigo definido, mas os dólares entregues para os contratos de “defesa” — quanto mais deles, com durações cada vez maiores, melhor.
A perversa referência de Obama a Lyndon Johnson pode ser interpretada como uma invocação de Harry Hopkins, o braço direito do presidente americano Franklin Delano Roosevelt. Hopkins resumia a história e os objetivos futuros de todos os estados em 1938 da seguinte forma: “Gastar, gastar, gastar, taxar, taxar, taxar, eleger, eleger, eleger.” A Segunda Guerra Mundial colocou o complexo militar-industrial no meio da teia de gastos e impostos. Ele permanece lá desde então e não tem intenção de abdicar de sua posição.
Quase 65 anos depois dos primeiros tiros da Guerra da Coreia, os EUA ainda mantêm quase 30.000 tropas ao longo do paralelo 38. Quase 75 anos após as campanhas europeia e japonesa, os EUA ainda mantêm enormes guarnições e presenças navais na Europa (cerca de 70.000 tropas) e no Pacífico (80.000).
O propósito dessa mobilização perpétua? Justificar os gastos de centenas de bilhões de dólares por ano em armas, equipamento, navios, aviões, quartéis e assim por diante, todos fornecidos pelos amigos de políticos da indústria de “defesa”. Matar não é necessário, a não ser para consumir a munição e desgastar as armas para que mais possam ser compradas.
O Vietnã foi uma guerra longa e lucrativa, mas um caso excepcional, porque teve um ponto final.
O objetivo de sucessivas administrações americanas no Oriente Médio parece ser retornar ao modelo do Vietnã, com apenas algumas modificações. A mitologia do Estado Islâmico (ISIS) como uma ameaça substancial (ou mesmo, na hipérbole dos representantes do governo, “existencial”) aos EUA, combinada com seu próprio status como um fantasma amorfo e mal definido que jamais pode ser “derrotado” se presta muito bem à extensão dos 24 anos de guerras.
Qual o objetivo da administração atual na Ucrânia? Estender a vida da OTAN em vez de deixar a já inútil “aliança” militar se aposentar.
A questão principal nas questões de guerra sempre é “O estado vai poder fazer essa guerra?”, que sempre é rebatida com “O estado pode não fazer essa guerra?”.
A real pergunta que devemos nos fazer, porém, é: “Será que realmente podemos ter um estado com suas guerras perpétuas?”